[Mini-conto pós-MekHanTrópico] “A Pegada Transbinária (Encontro onírico entre Dr. Fritz, O Acimador e o Cão Breu após a morte de Valdez)”.
Ao adentrar a Realidade Vegetal, desabitado de si, Dr. Fritz
percebeu que havia inúmeras possibilidades de existir no multiverso não-linear
onírico transdimensional. Algo inquantificável mekhantrópicamente, uma vez que
é impossível precisar ou prever quem sonhou, sonha ou sonhará com ele em algum
momento, em qualquer lugar. Mesmo depois de sua morte. Mesmo antes de nascer.
Mesmo sem nunca terem lhe visto de maneira validada ou virtual. Mesmo vivendo
(ou não) o tempo todo junto. Poderiam ou não sonhar. Ou, até mesmo, talvez
terem sonhado e esquecido.
A ficha caiu.
Passado, presente e futuro: grandes ilusões. Existência caótica.
Anti-teleológica. De Sócrates à Nietzsche. De Jung à Han. De Borges à Lynch. De
Mojica à Blavatsky. Dylan, Crowley, Kahlo, Gogh, Kafka, Kant, Seixas,
Platão…Entre tantas e tantos pensadores, artistas, magos, sonhadores. Seres
banidos do sistema sociopolítico cultural. Julgados e condenados como loucos,
bruxas, demônios. Por tentarem ser livres do pensamento do seu tempo.
Espaço.
Neste instante, surge à sua frente O Acimador, aquele que
interconecta os tempos e espaços, acompanhado de sua sombra fiel, o Cão Breu.
Criaturas viajantes de realidades reveladoras, pelos olhos canídeos
flamejantes, daquilo de mais importante que Dr. Fritz poderia saber: apesar de
todas as possibilidades transbinárias, a única que sonha consigo em primeira
pessoa é ele mesmo. Dr. Fritz é tudo, nada, todos e um só por ainda poder
sonhar e ser protagonista de seus sonhos.
Porém agora, um pouco mais distante da ideia binária de ser ou
não ser, Dr. Fritz pôde se reconhecer como uma possibilidade, um “talvez” solto
ao acaso, de maneira múltipla por si mesmo, perdoando suas culpas, medos e
angústias que seu inconsciente lhe imputava ser.
Ao se ver deslocado, também foi libertado das amarras
socioculturais que insistiam em lhe conter.
Enfim…
Como ele poderia saber que seus olhos viam na escuridão?
Cada coisa no seu tempo, apesar dessa ilusão.
Inadequação.
Todavia, deixou tudo acontecer por um segundo impreciso sem se
(pré)ocupar com os signos que o cercavam os sentidos. Observou com o espírito a
beleza daquele amanhecer. Sem demais pensar. Sem se sobrecarregar. Entregue ao
agora pra sonhar.
Inevitavelmente, num breve instante, uma sinapse nele despertou:
“por que os celulares nunca aparecem em meus sonhos se estou a usá-los 24 horas
por dia, 7 dias por semana?” Neste momento, o que havia ali ainda de humano se
foi.
Fritz se ligou: “Valdez está morto. Agora é permitido elogiá-lo
à vontade.”
E prosseguiu: “Tudo o que sei sobre minha luz foi minha sombra
que ensinou. Quanto mais escuro fica o poço, mais eu vejo o brilho das
estrelas”.
As Estrelas…
Ele, eu, você, todo mundo. Brilhos apagados. Padronizados como
se não houvesse algum. Controle binário. Anti-cósmico. Onde o ser é só mais um.
Parafuso. Engrenagem. Produção em série. Auto-sabotagem.
Assim, Dr. Fritz guardou seu brilho estrelar em uma pegada
concretada num lugar distante. Ali depositou a essência do que restava de seu
coração. Toda a fonte da vida. Traduzida em foto-partículas. Composição.
Bem ali, naquele instante decisivo, se libertou do ostracismo.
Transmutou-se em vento. Livre. Sem destino.
Pelo menos, assim imagino.
Texto: “A Pegada Transbinária (Encontro onírico entre Dr. Fritz, O
Acimador e o Cão Breu após a morte de Valdez”). Fredé CF. 26/03/2024.
Foto: Fredé CF (in Frauenkirche - Munich/Germany).
Este conto integra o universo ficcional transmídia "MekHanTropia", concebido durante o meu curso de doutorado em Arte e Cultura Visual pela UFG entre 2019 e 2023, agora em uma fase denominada "Pós-MekHanTrop(IA)".
Em breve este conto será parte de um novo lançamento musical transmídia: "TransparenZ".
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